sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Trabalhadores de Centros Espíritas muito doentes!

Fazer um levantamento das vidas dos trabalhadores dos Centros, em termos de saúde física e espiritual, vida familiar e social, ou explorar a frequência e o tipo de ocorrências que lhes surgem caídas do nada é, efectivamente, descobrir o fio de um novelo emaranhado e deveras quase impossível de dobar.
E quando dizemos “caídas do nada” não nos referimos à ausência de uma causa explicável, ou pelo menos passível de ser transmitida pela nossa parca discursividade. Referimo-nos a situações que em tudo nos parece que não deviam acontecer. Senão vejamos.
Como é que um medium pode dar um passe, que no fundo é um tratamento, quer físico quer espiritual, estando ele em situação de obsessão mais ou menos profunda? Como dar esclarecimento a alguém, incuntindo-lhe que a Doutrina tem resposta para os problemas, que a mesma, pelo esclarecimento, desenvolve a protecção contra as Entidades malévolas, que coloca a vida num rumo mais luminoso para Deus, se o trabalhador espírita não é capaz de exaurir os mais elementares proveitos da mesma, ou se o memo tem a vida de pernas para o ar, anda esbaforido à procura de um momento de paz e sossego? Como relacionar-se e integrar-se no andamento do quotidiano de um Centro, se tem a própria vida cheia de complicações que não é capaz de resolver? Que valor, que importância, que eficácia, que credibilidade, que veracidade há nessas pessoas e nos seus respectivos trabalhos?
Como podem defender a família, numa sessão de evangelização, trabalhadores que mudam de companheiro/companheira quase como quem muda de camisa? Não será isso um discurso oco, vão, e acima de tudo perigoso?
Com o passar dos anos, tem-se verificado um agravamento do estado de saúde dos trabalhadores. Os problemas que os assolam são cada vez mais e mais graves. Muitos “arrastam-se” para o Centro, ou porque, dizem, precisam de dar passes para se sentir bem, para fazer as suas obras de caridade, dar esclarecimentos, fazer o trabalho de evangelização. Defendem que tudo o que lhes acontece é kármico, não lhes passando pela cabeça que é precisamente o contrário. 
O desfasamento entre o que pregam e o que praticam é de tal modo grande, está de tal modo a léguas de distância que, entregues às forças negativas, têm as vidas completamente à deriva. Ainda não perceberam que não há doutrina à face deste belo planeta que proteja ninguém, se assim fosse haveria uma melhor que as outras. Ainda não perceberam, nas suas mentes discriminatórias e fechadas, que é o bem que nos salva e que esse bem tem que começar em nós, na nossa casa. Ainda não perceberam que só depois de nos limparmos é que podemos limpar os outros, ou mais correctamente, ajudarmos os outros a limpar-se. Na verdade, nós somos apenas bengalas uns dos outros, meros apoios enquanto a vigilância e a fé comandarem as hostes. 

A fétida alusão às Entidades trevosas como a raíz de todos os males que lhes acontecem, a fonte donde jorram todas as dores, resume o quanto ainda há muito por caminhar nesta vasta Doutrina. Tudo isso é revelador da proximidade com essas Entidades, que todos a temos, porém isso não significa, à luz do Espiritismo, que elas sejam as culpadas. É a nossa semelhança, a nossa fé, quantas vezes maior nessas Entidades que em Deus, que nos aproxima dos níveis donde, diga-se em abono da verdade, ainda não saímos.

Essa necessidade de “trabalhar” no Centro advém do facto de, à custa dos que o frequentam, serem eles a limpar-se. São os frequentadores que os aliviam dos males de que padecem e, quantas vezes, não são esses mesmos os silenciados porque ignorantes nos assuntos da espiritualidade?!
Por outro lado, se se fizer da Doutrina um discurso defensor do sofrimento, principalmente, então, em resposta, aí está o resultado. Confundem a ignorância, os cálculos por vezes erróneos que fazemos, tão simplesmente a nossa natureza ainda tão elementar, com sofrimento rumo ao bem supremo resultante de vidas passadas. Que sabemos nós do passado, se ele está esquecido, para nosso próprio bem? Que sabemos do presente, se a nossa consciência e concentração num ponto são infinitamente pequenas? Que sabemos nós de nós mesmos? Que sabemos nós do que quer que seja?

Claro que é mais fácil culpar o passado que, em breve trecho, se resume desta forma: para alguns, ele é o Adão e Eva que comeram a maçã, e por isso morremos. Se não fosse isso, seríamos imortais, isto é, viveríamos na mesma encaranção para todo o sempre. Para outros trata-se de uma herança genética: “Já os meus avózinhos, que Deus haja, tiveram os mesmos problemas, coitadinhos”. Para os espíritas mais iluminados, o presente completamente virado no avesso é obra de vidas pretéritas. Por outras palavras, se ninguém investe na sua modificação interior, se ninguém combate o sensualismo, a gula, a vaidade, o desejo de se impor seja a que preço for, se marido e mulher não lutam por se entender, se... claro que é mais fácil desculpabilizar o presente, inocentá-lo. É exactamente a mesma coisa que, num tribunal defender que um ladrão ou assassino não cometeu o delito, mas sim os espíritos que andam com ele. Está na hora de se perceber que somos tão responsáveis pelas companhias dos de carne e osso, como daquelas que não vemos nem sentimos. Porém, a responsabilidade do esclarecimento é de todos.
Não é compatível com a natureza de um Deus de liberdade e de bondade a teoria de que o karma é qualquer coisa deste género: se há quem viva numa lixeira é porque desbaratou em vida anterior; se há que seja doente do estômago é porque noutra vida foi rico e comeu demais; se há quem morra de fome é porque noutra existência não deu aos pobres do que lhe sobrava. Não seria mais assertivo aprender que estamos a falar de conceitos que não têm o mesmo significado para as diferentes culturas? Desbaratar, ser pobre ou ser rico, dar, sobrar, enfim, são coisas muito diferentes para uma infinidade de pessoas, eras, épocas, religiões, polícas, culturas? Se procuramos o absoluto destes conceitos, como de tudo, aliás, corremos o risco de cair na intransigência, no dogmatismo totalizante e esmagador, num racionalismo exagerado desprezante da fé. 

Esses trabalhadores tão doentes, fazendo tábua rasa do que a Doutrina ensina, excluem Deus da História, bem como a Sua infinita misericórdia, uma vez que “quem faz paga”. Factores histórico-sociais, civilizacionais, de consciência, psíquicos, etc., não contam. Esquecem-se de que não podíamos ser melhores; esquecem-se de que se assim fosse ficaríamos exactamente na mesma. Pagar uma dívida não significa nem arrependimento, nem exclusão da possibilidade de contrair outras. Múltiplos factores concorrem para que voltemos a contrair idênticas dívidas, pela necessidade, pelos que nos são mais queridos, por infinitas coisas que não nos passam pela cabeça. Caímos aqui, levantamo-nos ali. É assim que tudo acontece.

Não tivemos culpa? E quem diz que não? Mas não dessa forma. Talvez nem se trate de culpa, mas de uma vivência histórica que ainda não permite uma vida mais igualitária, tão simplesmente porque ainda não somos capazes, tal como a criança, por mais inteligente que seja, ainda não consegue caminhar sózinha. O karma não é uma vingança do passado, mas uma sequência lógica da nossa natureza. Quantos vivem em lixeiras e são inteligentes de tal forma que muito dariam à sociedade e ao mundo! Também somos os culpados por eles estarem lá, pela nossa indiferença, pelo nosso comodismo. Não é o seu passado, mas o presente que os empurrou para as catacumbas da miséria. Somos nós o seu karma, também.

A elevação vem pelo arrependimento e pelo muito amar. Vem por uma necessidade interior que, sem explicarmos como, a dada altura nos faz despertar para coisas mais sublimes, assuntos mais enriquecedores do sentido e da palavra, que lhe está intimamente associada. 

Nos Centros, a situação de sofrimento dos trabalhadores é concomitante com uma quase ausência de valoração da prece como o único discurso com Deus e para Deus, o discurso curador de todos os males, a nobre e brilhante Palavra.

Torna-se imperioso reflectir sobre o modo como cada um está na Doutrina. Com tantos congressos sobre nada, com tantos discursos perdidos no silêncio da insensatez e da ignorância, com tantas jornadas para tudo e mais alguma coisa, ainda não foram capazes de enfrentar o animal da vaidade e fazer uma reflexão sobre: Porque estão os trabalhadores dos Centros, na sua esmagadora maioria, tão doentes? O que é que lhes falta? O que é que não está bem?
É que não estamos a falar dos escolhos que assolam a sociedade presente, nem dos vulgares arrufos que nos surgem. Estamos a falar de uma superlativização dos problemas, de uma resistência em aceitar os ensinamentos doutrinais, uma inércia quanto à prática das suas máximas. Porquê? Que cada um procure a resposta, ou uma resposta. 
Esperemos que esta situação faça um retrocesso e a Doutrina volte a ser um discurso de esperança no coração e na boca de quaisquer dos seus trabalhadores.

Margarida Azevedo 

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